quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Mahamudo Amurane



Do Islão a Jesus Cristo



Anos 80 do século passado! Moravam nos subúrbios da cidade de Nampula, no Bairro do Muhala. Todos os dias um grupo de meninos fazia caminho para a Escola Secundária de Nampula.

- “Certo dia, uns missionários aproximaram-se de nós, do grupo, e chamaram: você, menino...! Não, não - diziam a um do grupo que, por posicionado mais aproximado, correspondia ao chamamento - aquele menino, aquele, sim você, pode chegar aqui, por favor! Era a mim que eles desejavam falar”.

- O menino costuma pensar em Deus? Costuma rezar? Qual é a sua religião? - inquirem os missionários.

- Sim, sou muçulmano!

- E costuma ir à mesquita orar?

- Agora a minha prioridade é estudar. Vou à mesquita quando posso!

- Mas é necessário pensar em Deus! Isso não tira tempo para os estudos. E ir à mesquita também não tira muito tempo. E orando, até os estudos vão correr melhor! - insistem os missionários.

Passado algum tempo, no mesmo sítio, à mesma hora, outro grupo de pessoas como o anterior o interpela e repete a mesma conversa. Mas a esses, o menino Mahamudo Amurane, “despachou” mais facilmente. Já estava treinado. Sabia do que se tratava.

Mas, aconteceu uma 3ª vez..., junto à mesma árvore, que ainda lá está hoje, me relatou o já Presidente do Município de Nampula.

-  Aí, padre, eu perguntei-me: "Mas que é isto? Pessoas sempre diferentes e a quererem falar só comigo, quando há aqui outros companheiros!? Porquê comigo? Nisto deve andar Deus, pensei comigo”.

Por isso, nesta 3ª vez, o menino, impressionado, foi mais acolhedor e já não tratou de despachar os interpeladores missionários.

- De facto, estes missionários insistiam e eu, pressentindo que Deus andava metido nisto, acabei por aceitar o seu convite para me juntar à sua Congregação. Uma vez ali, senti-me muito emocionado e, devo dizer, padre, que nunca tinha sentido que Deus está mesmo muito próximo de nós. Com gosto permaneci naquela Congregação do Prédio Lopes!

Era, como sabemos, uma Assembleia de Deus, sediada no chamado Prédio Lopes.

E continua, a contar-me, o, naqueles dias, já Presidente do Município de Nampula:

- A certa altura, comecei a ter a sensação que já não era bem acolhido, desejado na congregação, porventura, pensei eu, devido ao meu nível académico: andava já na 9ª classe.

De facto, naqueles anos já longínquos para quem nasceu ou cresceu depois da independência nacional, dada a carência de quadros no país, acedia-se a ser professor com 6ª classe +1, ou 7ª+1 ou 2; depois 10ª mais alguma formação em instituição pedagógica.

Ao ouvir este relato, eu, que guardei até hoje esta narrativa, adverti-o: 

- “Pois é Presidente, naqueles anos andar na 9ªclasse seria quase como hoje frequentar uma licenciatura.

E prosseguiu o meu interlocutor Amurane, naquele dia 15 de Janeiro de 2015, momentos depois de, pela rádio do carro, pois outra energia não tínhamos naqueles dias tormentosos das cheias na Zambézia e todo o norte de Moçambique, eu aguardar a sua chegada enquanto escutava a reportagem da posse do actual Presidente da República, Filipe Nyusi:

- Dominado por este sentimento de real ou aparente rejeição na congregação da Assembleia de Deus, um dia, caminhando na Av. Eduardo Mondlane, passando em frente à catedral de Nampula, senti-me, interiormente, incitado a entrar.

Entrei e senti-me fascinado pela “organização”, pelo silêncio na oração, contrastando com o modo orante ruidoso da congregação onde, até então, eu tinha frequentado! 

Aderi ao grupo dos jovens e entrei no Catecumenado.

Mas entrementes, completei a 11ª classe antes de ser batizado. Viria a sê-lo no Maputo, onde já frequentava a Universidade Eduardo Mondlane, na Comunidade da Paróquia de Santo António da Polana! Fui baptizado pelo Frei Armindo. O Padre conhece-o?

Se conheço! É, hoje, Outubro de 2017, o Provincial dos Padres Franciscanos em Portugal.

Como Jesus de Nazaré, Mahamudo Amurane foi pascoalizado pelo crime, pelos inimigos da Paz!
Aguarda-nos no céu donde nos incita com as palavras de Santo Agostinho:

Se me amais não choreis!

Mas como podemos nós, familiares, amigos, seguidores dos ideais criativos e inovadores de Amurane não chorar? Como preenchermos este colectivo sentimento de orfandade de todo um povo de Nampula?

Não chorou também o Senhor Jesus sobre a cidade de Jerusalém lamentando-se sobre ela:

  • Se tu reconhecesses hoje o que te pode trazer a paz! Agora, porém, isso está escondido aos teus olhos! Dias virão em que os inimigos farão trincheiras contra ti e te cercarão de todos os lados. Eles te esmagarão a ti e aos teus filhos. E não deixarão em ti pedra sobre pedra. Porque tu não reconheceste o tempo em que foste visitada”
Como Deus tem os seus desígnios! 
Quem, de alma limpa e coração puro, não há-de vislumbrar nesta caminhada religiosa de um humano, o dedo de Deus? Que do seio de Deus, Amurane interceda pelo seu Povo de Nampula, por todo o Povo Moçambicano, na construção da dignidade e da Paz.