quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Soares Martins - Um Vigilante contra a mediocridade

No passado dia 14, festa da Exaltação da Santa Cruz na Igreja Católica, faleceu num hospital do Porto, depois de prolongada doença com que lutava há mais de um ano.

No dia seguinte, familiares, amigos e admiradores, celebrámos a sua Páscoa: na Igreja da Cedofeita (Porto) e na Igreja Paroquial de S.João da Madeira (seu concelho natal).

Os meus primeiros contactos com o Soares Martins datam do meu acordar para os problemas críticos de Portugal e das suas colónias.  José Capela, de seu pseudónimo, chegou-me às mãos pelos pequenos livrinhos que ia fazendo aparecer..." O Vinho para o Preto" era título incontornável e inesquecícvel. Depois, quando já com experiência de chão moçambicano, Moçambique pelo seu Povo.

Física e pessoalmente, conhecê-lo-ia só quando ele apareceu como Adido Cultural na Embaixada de Portugal no Maputo. Foi ocasião para beber a longa experiência de um homem que, ao lado do seu fabulosíssimo tio, o 1º Bispo da Beira, Sebastião Soares de Resende, se afirmara nos combates pela dignidade do Povo Moçambicano nos tempos duros do colonialismo.

Foi chefe de redacção do combativo Diário de Moçambique, jornal da diocese da Beira.

Fui um dos que, com frequência, partilhei a sua mesa, com muitos amigos moçambicanos, das esferas da intelectualidade, do saber e da cultura plurifacetada. Nos contextos tantas vezes ambíguos da realidade.

Cativou-me sempre a simplicidade do diplomata que se esquecia que o era, dada a evidente simplicidade do seu porte. Impressionou-me sempre a cordialidade que se sentia fluir entre ele e o seu dedicado cozinheiro, senhor Morais.

Vivi, mesmo que esporadicamente, por entretanto eu ter regressado a Moçambique, a encantadora relação de amor irradiando do casal que era o Soares Martins e a sua mulher, a Joaquina. Duas autonomias visivelmente casadas!
(Informação mais detalhada na carta anexa - José Capela)




quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Vigilância da PAZ


Com uma semana de atraso, tive oportunidade de visionar, no Youtube, as cerimónias da assinatura do que a imprensa moçambicana chama de Acordo de Paz II.

No momento de troca dos documentos assinados, fiquei momentaneamente interrogativo: vai haver abraço ou simplesmente o protocolar aperto de mão?

Parece-me que Dlhakama tomou a iniciativa do gesto do abraço! E Guebuza correspondeu sem demora. Espontâneo! Mas eu, interiormente, continuava, no meio de muita emoção, a ser invadido pela interrogação: serão mesmo abraços de lealdade, de efectiva e definitiva reconciliação? Todos desejamos que assim seja.

Escutei com íntima e comovida atenção os discursos dos 2 líderes protagonistas do acto. Apreciei a firmeza e a objectividade. As palavras certas, estiveram ali. As farpas mutuamente disparadas - inevitáveis nestas circunstâncias? - foram suaves. Sublinho a frae de Guebuza "temos e devemos confiar na nossa capacidader endógena para também realizar o nosso sonho colectivo de prosperidade e bem-estar". 

Penso que esta capacidade sempre existiu. Mas a história recente mostra que a capacidade de não lhe ser fiel também é real. Por isso ao mais de um milhão de mortes da guerra civil dos 16 anos, somámos, no ano passado, um desconhecido número de mortes. São, por isso, muito oportunas os seus apelos a que. doravante,  todos se conformem escrupulosamente com os ditames legais/constitucionais. Parece que está tão ciente, como eu, da precaridade da natureza humana e, expressamente, apela à "a atitude vigilante e de elevada consciência de cidadania" para que nunca mais se volte atrás.


Este momento, tempo de campanha eleitoral, é particularmebte importante para o exercício da cidadania a que o Presiente da República apela. Porém, hoje, dia 11 de Setembro (de má memória internacional), os jornais já noticiaram atropelos à lei e à convivência democrática na campanha eleitoral. Tenho para comigo que aos membros da Frelimo vai custar muito a aprenderem a trabalhar politicamente em pé de igualdade! São 40 anos de acumulação do vício da superioridade institucional, regimental.. Se a conversão pessoal não é fácil, a colectiva é dificílima, sobretudo quando o que está em causa são as benesses decorrentes do exercício do poder! Mas "água mole em pedra dura tanto dá até que fura" e "a esperança nunca morre!". Assim o esperamos.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Novos Céus e Nova Terra (Duas reacções de leitores)

Recebi algumas reacções de pessoas amigas ao post com este mesmo título "Novos Cèus e Nova Terra"
Pelo interesse que me parece que têm em termos de intercâmbio de opiniões, aqui transcrevo duas.

1ª reacção

" Li o artigo e achei bastante interessante, sobretudo por manifestar as suas reais convicções...Ultimamente fomos habituados a ler e ver na televisao analistas a defenderem mais o que os outros (alguns) pretendem do aquilo que  o bom senso evidencia...

Nao sei se foi a melhor forma...mas foi a forma possivel de se fazer algo em prol duma suposta mudanca que viesse em defesa do povo, que clama deseperadamente por Socorro do sufoco que lhe está a ser imposto (ao chegar-se onde se chegou creio k valeu a pena , alias tudo vale a pena se a alma nao e' pequena)  com todas as tristezas, desgracas e sofrimentos pelo que o povo passou ...

Os discursos da renamo trazem no fundo um subjacente pedido de perdao...os discursos do governo (ultimos) nao sendo de arrogância desmedida, pretendem tapar o sol com a peneira fazendo transparecer que não tem culpas no cartório e agiu da melhor maneira...e aqui nem quero dizer que um é melhor que o outro...

o xadrez politico alterou substancialmente as regras internas de fazer politica...estamos a trazer soluções antigas para problemas novos (alguns)  e influenciados por tendências que marcaram fases do nosso percurso politico...funciona pouco...tem de haver muito boa vontade  de quem de direito para alterar este estado de coisas e dessa attitude dependerá o futuro do Moçambique...

Tome que rumo tomar, Moçambique nunca mais vai ser o que era antes e o que tiver que acontecer somente o futuro no-lo dirá... e tem que se tomar consciência dessa realidade presente...

É apenas um ponto de vista...

O autor desta opinião, a quem perguntei se podia também publicar a sua identidade, recomendou-me:

"pode dizer que recebeu de uma pessoa amiga...tristemente ainda tem de ser assim..."

Vemos bem que o medo ainda prejudica muito a saúde democrática por que todos ansiamos. 

2ª reacção:

 "Zeluzia,

Cheguei tarde tarde em frente a tela de televisão, me encontro em Nacala para mais uma semana de aulas modulares mas, tive a oportunidade de assistir a assinatura do acordo geral de Maputo. Ainda nao tive a oportunidade de ler o conteúdo inserido nos tais documentos o que, suscita alguma expectativa. Mesmo assim, os entrevistados manifestaram algum optimismo. 

Me surpreendeu deveras o discurso de Afonso Dhakama: muito curto reconciliatório e  essencialmente recheado de urbanismo, cidadania e muita humildade. É pena tenha sido tudo feito à custa de sangue de inocentes. Desta vez me parece estar convencido de, com apoio e ajuda de facilitadores,  ter resolvido os problemas que, em Roma, não terão conseguido, por não terem percebido as peripécias do governo do dia, na altura. 

Percebe-se que os negociadores acutais,  com ajuda de facilitadores nacionais e com alguma mão do exterior, suplantou a vontade endógena. Os apelos à não violência que os seis dias no minimo tentaram mostrar me parce ter sido a maior prenda para os que vivem e querem pacificamente viver em Moçambique. Quem teria  elaborado discurso? Acreditamos que tera sido escrito por ele próprio.

Por sua vez, o senhor Armando Emílio Quebuza, num discurso que afastou todas as hipóteses de caça às bruxas, na presença de toda a ala conservadora de seus companheiros, criou o fundo de pacificação. Como disse, não tem intenções de distribuir dinheiro mas apoiar, de certa maneira, aquelas forças residuais da Renamo, relegadas para o plano secundário. 

Denotou-se alguma sinceridade na cara dos fazedores para a devolução da paz aos proprietários dessa paz que, não sendo povo, vivemos neste pedaço pertença de todos os que se acham moçambicanos. Somos ainda um povo e uma nação em formação... 

As reações das pessoas não se fizeram esperar, com elogios por todos os lados. A esperança renovada. A campanha de Daviz não parou, continuou com festa gratuita apelando ao voto e à mudança de atitude inclusiva. Respeitaremos o calendário de mais 20 anos de paz? Eu acredito que sim. (SCTurra)

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Novos Céus e Nova Terra

À hora em que escrevo, deve estar a terminar o banquete da reconciliação no Maputo. Que Deus seja louvado pelos irmãos reconciliados. Naquela mesa, todos estivémos, em espírito!

Os jornais relatam a onda de entusiasmo e euforia com que o povo (há sempre povo para todos) acolheu o líder da RENAMO de regresso à capital do Maputo donde nunca deveria ter saído. Saudaram-no como "messias" mas parece que tiveram o cuidado de o desidentificar de Jonas Savimbi que, no mês de Janeiro de 1975, assim era saudado no chão das avenidas de Luanda "Savimbi, o Deus na Terra". Todos sabemos em que se traduziu tão falacioso messianismo.

Entre a saída e o regresso de Afonso Dlhakama à capital, ficaram milhares de vidas moçambicanas sacrificadas no altar do ódio, da arrogância armada, da incompetência e da intolerância políticas.

Faço votos - e quem é que os não faz? - por que a Paz não seja efémera mas decisiva e eterna. Que nos novos desafios e nos conflitos políticos que inevitavelmente surgirão entre as distintas forças políticas ninguém mais se lembre de ameaçar com armas. Que a civilidade seja servida, em cada mesa política, antes da refeição (parafraseando Tiago de Melo).

Infelizmente, as soluções não foram tão genuinamente moçambicanas como se desejaria. Foi difícil, mas os observadores estrangeiros aí estão para, eventualmente, garantirem, ou não, a correcção do que falta concretizar e que se torna mais difícil e melindroso: despartidarizar, radicalmente, o aparelho de estado e governamental, sobretudo as FADM e as polícias.

Que um soldado e um polícia possam ser vistos, sempre, como amigos e leais servidores de quem, em qualquer dificuldade, deles possa precisar. Como me vêm à memória os cravos vermelhos na ponta das espingardas, no meu Portugal Natal, no 25 de Abril! Soldado, camarada e Amigo! E irmão! Que não mais haja directores de serviços, sejam quais forem, que tenham, em Moçambique, de fingir serem do partido governamental ou do presidente do município. Nunca mais!

Sim, Moçambique que, no meio de muito sangue, já foi apontado como um exemplo na solução de conflitos gravíssimos pelo diálogo interno, reapareça, agora, como exemplo, para o Mundo, como construtor de uma genuína democracia moderna.
Que fique livre de teias monopartidárias e, também, dos atavismos tradicionais, por vezes teimosamente apresentados, tanto por alguns estrangeiros como por alguns nacionais, como intransponíveis tropeços à construção de um estado moderno e republicano.

Com os corações alimentados dos Novos Céus, construamos, aqui a Nova Terra. Em religião cristã costumamos convidar à Confissão dos Pecados, a pedir perdão por eles e a fazer sérios propósitos de Consciência. Bom seria que a Renamo e a Frelimo o fizessem nesta hora de novas partidas. Pedir perdão ao Povo Moçambicano, pelas vidas sacrificadas, não seria humilhação, mas nobreza de alma e superioridade política!